domingo, 7 de fevereiro de 2021

O VELHO NICANOR


Muitos fregueses passaram na História do Supermercado Ferraz, na maioria tornaram-se  mais do que fregueses, deixaram a amizade e muitos casos pra contar, como o Nicanor.

O Sr Nicanor era um homem alto e forte que possuia uma voz firme, sempre se vestia com um paletó meio amarrotado,chapelão estilo coronel, calças de tecido tergal e botinas surradas,tudo cheirando naftalina.

Na entrada da sua casa tinha uma varanda com uma velha cadeira no qual ficava  horas e horas a cumprimentar as pessoas que passavam na rua e ali também recebia os amigos para longos causos.

Viúvo a décadas e com a familia toda criada, cada um com rumo diferente, morava sozinho e sempre com um ton de bricandeira clamava que na sua vida já não lhe faltava mais nada, apenas uma morena para viver com ele em seu lar. 

E por falar em lar, dentro de sua casa era uma tranqueira só. Muita roupa espalhada pelo sofá e dentro de um  armário que já não fechava as portas, máquina de costura da falecida, pratos e panelas pendurados nas paredes ao lado de teias de aranha, havia também o fogão de lenha com as trempas todas enferrujadas.

O rádio antigão ficava próximo da porta da varanda com volume alto que dava para se ouvir lá na esquina, sempre atento aos programas da emissora, as noticias de falecimento e no horário

Falando em horário, de manhã fazia ele mesmo o  café e quanda dava a hora do almoço, verificava no seu relógio de bolso a hora certa , montava em sua bicicleta monark vermelha e partia para a pensão da Mariazinha no centro da cidade, perto da igreja, lá almoçava todos os dias.

Quem conhecia o Nicanor brincava muito com ele sobre  a bagunça na sua casa:

- O Sr Nicanor tem que fazer uma faxina na sua casa, deve ter muita pulga lá!

E o velho Nicanor respondia:

- Que nada meu filho, tem pulga não, os percevejos comeram tudo.

E dando suas garagalhadas a toda brincadeira feita e todo causo contado, vivia sua vida , como mesmo dizia , do jeito que Deus vai mandando.

Aldeir Ferraz

MARCAS DO QUE SE FOI (PARTE 03)

 A alimentação é essencial para nossa vida. Isso é fato, ocorre que alimentar se tornou também a necessidade de satisfazer nossos desejos e virou um status.

Quem trabalha no comércio alimentício percebe como é essa busca por produtos que garantem a vida, supre os desejos e aponta nossa posição social.

Desde o inicio do armazém Ferraz passei a notar esta situação nas compras de muitas pessoas.

A qualidade versus preço, a propaganda versus o costume é o conflito na hora da escolha.

Dentro do comércio é preciso atender todo o tipo de perfil.

Marcas antigas mostram o costume que vem de geração, como o macarrão Guiricema. Por décadas vêm passando de pai pra filho. O Galo com macarrão tem que ser do Guiricema.

A diferença social durante um tempo era mostrado por aquilo que se adquiria, exemplo:

Extrato tomate Cajamar coisa do povão, extrato tomate elefante era para os mais abonados;

Oléo de milho Mazolla só rico comprava, óleo de soja mais para o povão. O consumo de óleo para a maioria do povo da roça se dividia com a gordura de porco, muitos tinham hábito de criar porcos em chqueiros;

Bacalhau era coisa de rico, o peixe majubinha  para o povo mais pobre;

Arroz japonês, agulhinha para quem tinha mais dinheiro, arroz quebradinho e santa catarina para os mais pobres.

Alcaparras, cogumelos, atum, ervilha.... Itens raros na lista de compras do povão.

Hoje este cenário mudou e o desejo domina a compra de todos e é claro com a  melhora do poder aquisitivo.

O pé de galinha que era um alimento só de pobre, depois que os mais ricos descobriram que ele tem colágeno, disparou no preço.

O pé deu um salto e ficou caro.



sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

MARCAS DO QUE SE FOI (PARTE 02)

 A história nos conta que foram os índios que ensinaram aos colonizadores a tomar um banho, ser mais cuidadoso com a higiene pessoal.

Nos dias atuais contamos com uma infinidade de produtos que nos garantem nossa higiene, mas não era assim em décadas passadas.

Lá no inicio do armazém Ferraz existia produtos de higiene pessoal que eram adquiridos pela freguesia.

O interessante que o produto adquirido mostrava qual sua posição social econômica.

O sabão por exemplo, a marca coringa, um sabão preto era comprado pelos mais pobres. O sabão verde da marca radical era comprado pelos mais remediados e o sabão brilhante (azul e cheiroso) era para os ricos.

O sabonete gessy era do povão, o lux dos remediados. O sabonete Phebo, Francis e lux luxo era dos mais ricos.

Tinha uma situação diferente com o sabonete francis de caixinha. Ele servia como presente, quem nunca ganhou ou deu um de presente?

Os perfumes eram uma beleza, pois naquele tempo era moda andar muito cheiroso, atraía namoro e espantava mosca.

Desodorante Phebo, Rexona, Musk, almíscar, Leite de Rosas, Leite de aveia Davene....

O almiscar era muito usado por padres, lembro do Padre Raimundo que nos abraçava com sua batina e aquele perfume ficava empregnado na gente por muito tempo.

O perfume musk era do tempo que nós homens andavamos com a camisa meio aberta pra mostrar o cabelo do peito perfumado. Na verdade morríamos de inveja do Tony Ramos.

O cabelo era lavado com sabão de côco e os mais abonados usavam creme rince, neutrox, shampoo colorama e para os cabeludos tinha o gel, oleo de ovo e babosa.

Na pele pra tirar alguma frieira tinha pomada minancora, o polvilho antisepico para o chulé, dava pra colocar maizena também.

Por fim não podia faltar neocid que matava bastante piolho.

Aldeur Ferraz


quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

MARCAS DO QUE SE FOI (PARTE 1)

 Se eu tiver enganado me corrijam, mas as décadas de 70 e 80 aceleraram o processo de influência das propagandas em nossas vidas.

A personalidade muitas vezes se formatava por publicidades.

O cigarro era clássico nesta formação, cada marca ditava uma regra.

Lá no armazém Ferraz quem comprava o cigarro Mustang era meio peão, meio cawboy. Os cigarros Continental, Vila Rica era do povo ligado ao futebol, aos bares, bate papos, a turma que sempre levava vantagem.

O Carlton, Minister, Malboro era de uma elite de empresários, gente importante, autoridades de alto escalão. Os cigarros Hollywood, Free, Plaza, tinham adeptos com a galera das viagens, da vida mais liberal.

Cigarros filtro longo como o Luxor e o Shelton era do pessoal mais filosófico. Lembro do Prof Milinho, que sempre fumava destes com uma cigarrilha.

Os cigarro, Arizona,derby, imperador sem filtro, fumo de rolo, fumo capitão, dois irmãos, Arapiraca era do povão.

O Charuto cubano era para os comunistas.

Consumir estas marcas promovia a sensação de pertença.

Quem fumava tinha status, era chique e até arrumava namoro.

Eu mesmo comecei a fumar o cigarro Tempo, um cigarro diferente de cor marron, lembrava charuto, pra arrumar uma namorada.

Dei sorte e fui convencido a parar de fumar por causa do meu primeiro namoro.

Aldeir Ferraz



PIMENTA NO OLHO

Uma comida bem temperada é outra coisa. 

Aqui no interior mineiro, o sabor da comida é incomparável. Quem nunca saboriou um franguinho com quiabo?

O sabor tem haver com o tempero no ponto certo.

A pimenta é uma especiária muito usada.

Lá no armazém Ferraz tinhamos uma máquina de moer pimenta do reino, tradição que veio lá do tempo do Jesus Cardoso.

Moíamos kilos e mais kilos de pimenta. Como era vendido naquela época! Sacos e mais sacos de 25 kg eram encomendados, tudo em grão pra ser moido e colocado em uma lata fechada. Era abrir e o cheiro era forte.

Os açougues compravam a pimenta para temperar as linguiças.

Já trabalhei moendo muita pimenta e aquilo fazia espirrar com o cheiro forte e aí se passassemos a mão nos olhos, ardia que era uma beleza.

A maior propaganda da pimenta era o espirro.

Espirrou, o freguês mandava aumentar mais no peso.


Aldeir Ferraz

terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

CANA DE AÇUCAR

 A cidade de Visconde do Rio Branco era cercada por plantações de cana de açucar. A maior parte das terras eram da Cia Açucareira Riobranquense, mas existia também os pequenos e médios canavieiros que cultivavam cana em suas terras para fornecer para usina. Alguns deles mesclavam seus negócios com produção de rapadura e cachaça.

Tínhamos uma economia dependente da sazonalidade da cana. A safra começava mais ou menos junho e julho. A festa de São João Batista, padroeiro da cidade, dava o tom de uma cidade movimentada, aliás todo mês de junho era uma festança só.

O armazém Ferraz ficava sempre cheio com o povo trabalhador tanto da usina, como na lavoura.

Os dias de pagamento, caminhões e mais caminhões paravam no centro e deles desciam as turmas com dinheiro no bolso para realizar suas compras.

Era uma alegria só estes dias de pagamento, pena que o dinheiro que recebiam acabava muito rápido.

Com sacos cheios de suas compras subiam novamente nos caminhões e partiam para suas casas. 

O trabalho neste periodo de corte da cana não faltava, quem estava parado era só comprar um facão e um par de kichute e entrar nas turmas.

Facão, enxada, kichute, chapéu eram produtos que mais vendiam.

Tempos duros, tempos diferentes, mas tempos em que a convivência era mais sincera e doce.

AldeirFerraz

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

ARROZ COM FEIJÃO

 O nosso prato segue a tradição até hoje. O arroz com feijão é de fato sagrado nas nossas mesas.

Apesar de serem os primeiros produtos na hora da compra, o arroz e feijão perderam o espaço na produção na nossa região.

No inicio do armazém Ferraz, a maior parte ou totalidade da compra de arroz e do feijão era feita aqui na região.

Visconde do Rio Branco possuia várias Máquinas de Arroz. Tinha o João Filipinho, Francisco Ferraz, Adão Ferraz...

Para enchermos os caixotes do armazém compravamos o arroz em casca e levavamos para as máquinas beneficiarem.

Tinha arroz caturra, Santa Catarina, agulhinha, goianês..... Isso não era marca não, era a qualidade do arroz, coisa que poucos conhecem hoje.

O feijão era produção de grande fartura na região, sempre chegava alguém com sacos e mais sacos de 60kg em suas charretes para negociar.

Tinha feijão vermelho, preto, carioquinha e que eram conhecida suas produções como feijão das aguas, feijão 60dias....

O feijão para não dar bicho que estragava os grãos, usava-se terra de formiga, outros usavam um comprimido que colocava se no meio da sacaria e ficava conservado.

Hoje a produção regional é baixa, vem a maior parte de fora.

Aldeir Ferraz



Vá na Fé Mestre Dão

O caminho agora é outro! Nossa! Quanto chão ficou pra trás. Lá na roça a quantidade de dias de Sol que tomou no lombo. Os calos na mão, cres...