quarta-feira, 7 de outubro de 2020

A LUZ QUE ENTRA EM NÓS

"A ferida é o lugar por onde a luz entra em você."

Não conhecia, mas me foi apresentado um sábio espiritual do seculo XIII, mulçumano de nome Rumi.

Gostei desta frase que pincelei em seus ensinamentos.

"A ferida é o lugar por onde a luz entra em você."

Pois então, hoje 07 de outubro de 2020, completa 04 anos que meu irmão Marquinho fez a grande viagem, voou para o infinito.

Naquela época, poucos dias antes, tinha perdido uma eleição que disputei. Toda a derrota é triste, mas naquele momento não tive espaço para curtir minha derrota. Ele estava no hospital e pra lá fui. Acompanhei até o fim sua agonia.

O tempo passou daquela despedida e ferida na minha vida e de todos nós parentes e amigos dele.

Feridas aliás passei a ter muitas nestes quatros anos. Quantas coisas aconteceram de machucar a alma.

Interessante que todas as minhas feridas tenho incrivelmente conseguido superar.

 A ferida é o lugar por onde a luz entra em você. Concordo de vivência com estas palavras.

Alguém sempre tem enviado uma luz para romper com minhas feridas.

Hoje compreendo o quão é bom que lá do mundo da luz tenha alguém que envia um facho luminoso que transpassa nossas feridas abertas.

Valeu Marquinho, valeu por sua luz.



Aldeir Ferraz.



sexta-feira, 2 de outubro de 2020

A MÃE TÁ SECA


Mãe Terra seu leite tá secando, a passarada bate asa e com o bico tá piando;

A capivara cambaleia, caminhando no chão rachado e com olhos lacrimejando;

Há tanta fumaça, tanto fogo e do mormaço do calor o bicho tá correndo;

Não há lugar pra ir, não há lugar pra voltar, assim a maritaca tá contando.

Oh minha mãe terra, que tanto tens para dar aos seus filhos  ajuda, ajuda;

Liberte das suas entranhas  todo líquido cristalino e dá de beber a quem esconde na gruta;

Do calor do seu chão, eleve todo vapor para que as nuvens se encham de águas em gota;

Molhe seu corpo, molhe seu verde, nos molhe e volte a ser a mãe que amamenta.

E a cachorrada late lá fora e a seriema chora desesperada, nem urubu tá no céu;

É triste a tristeza que toda natureza tá carregando, nem as abelhas produzem mel;

Minha gente como é possível, nossa mãe maltratada assim, vivendo ao léu.

A mãe tá seca, a mãe tá seca, grita a bicharada e a mãe vê a tudo enlutada em um véu.


Aldeir Ferraz


sábado, 26 de setembro de 2020

O VELHO E A SANFONA

 

Enquanto o som daquela sanfona preenchia o silêncio da varanda, o velho brilhava seus olhos e a primeira lágrima  já escorria  no rosto marcado pela lida.

A sonoridade das músicas antigas que saiam da decisão do sanfoneiro em acertar com perfeição os acordes de tão belo instrumento provocava uma inevitável viagem no tempo.

Mesmo se valendo de uma bengala, naquele instante já se sentia aquela criança que  foi em um longínquo tempo e com um suspiro apenas pode sentir a brisa que lhe batia nos galopes em um cavalo de pau pelas trilhas deixando muita  poeira para trás,

A música penetrante nos ouvidos levava a uma eternidade de pensamentos sobre a longa estrada até o momento percorrida.

Amores, amigos, flores e dores tudo se foi deixando de ser visto com olhos e agora apenas sentido  com o coração;

E quando as melodias cessaram o velho  então foi se  recobrando daquele extase ,  ajeitou seu chapéu e como quem apeia em uma estação de trem , olhou  para tudo e para todos sem dizer nenhuma palavra, apenas sorriu.

Aldeir Ferraz



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quarta-feira, 23 de setembro de 2020

PROJETO DE UM CAMINHANTE



Na manhã de um domingo, durante uma caminhada ao sabor do vento, encontro um pedaço de papel no chão. Nele estava escrito: “Caminhante,  não há caminho, o caminho se faz ao caminhar”. 

Nascia ali um projeto que a  princípio teria um começo, um meio e um fim, mas que passado quase 04 anos ainda não se concretizou da forma como gostaria.

A frase que encontrei é do poeta espanhol “Antônio Machado” que resolvi ler, aliás além dele busquei outros também. O interessante   é que todos não se formaram poetas, escritores, autores de livros, no máximo apenas aprimoraram a escrita. Todas as suas obras surgiram de algo que para mim é inexplicável, mas alguns chamam de inspiração.

Quando comecei a escrever passei a perceber isso, pois gosto de ouvir histórias das pessoas mais velhas.  Quanta riqueza tem na memória deles! Antes do livro ou mesmo depois, muita coisa era passada de geração em geração através dos ditos “causos”.

Assumi este desafio e comecei a transportar muitas falas de gente simples, mas com uma carga de conhecimento incrível para um pedaço de papel.

Muito das crônicas revelam coisas ora engraçadas ora  tristes;  ora de saudade, de conselhos, opiniões... A tal inspiração vai surgindo no caminho e ao caminhar.

Pensei em colocar isso tudo em um livro. Ainda espero chegar lá, mas enquanto não se realiza este sonho, resolvi partilhar o que escrevo.  Criei o blog “De Caminhos e Sonhos” (decaminhosesonhos.blogspot.com).

Hoje tenho mais de 130 textos publicados e mais outros cem em casa para publicar, e continuo escrevendo, pois ainda tem muita história por aí que precisa ir para um papel.

“Caminhante, são tuas pegadas o caminho e nada mais;

Caminhante, não há caminho, Faz-se o caminho ao andar...”


Aldeir Ferraz



terça-feira, 22 de setembro de 2020

O TRABALHO QUE DIGNIFICA OU DANIFICA



Se trabalhar mais, vai adoecer e se não trabalhar, vai adoecer também.


Este é o drama de vida de muitos trabalhadores e trabalhadoras deste país.


Conheci um caso desses fazendo fisioterapia. Um senhor já calejado pela vida lutando para se recuperar de algumas dores em seu joelho. Por coincidência estava também com problemas parecidos com o dele.


Enquanto fazíamos os exercícios dentro de uma sala, puxei conversa e me contou que era aposentado, mas sua renda não dava para manter sua família. Tinha que trabalhar, não havia outra opção.


Dentro de um chão de fábrica sua função é bem pesada, anda pra lá e pra cá. Tem hora que precisa baixar a cabeça, ir pra um canto, pois teme que alguém veja sua cara de dor e possa ser mandado embora.


O medo lhe corroí, pois precisa superar tudo para se manter naquilo que te mantém. O seu trabalho é muito importante para o sustento da sua e de outras vidas.


Vivemos em tempos do medo e isso nos impede de alcançarmos uma felicidade plena, pois neste conceito de mundo, somos necessários até quando possuímos vigor, saúde, energia. Quando a energia se esvai, passamos a ser descartáveis e outros assumem o nosso lugar, até que sejam também descartados.


Há um limite para o nosso corpo em suportar o trabalho e infelizmente isso não é reconhecido pelo Estado que estamos tendo.


Seria preciso garantir o direito de ter uma renda digna não na lógica do fim da vida, mas quando os limites já nos impedem de seguir no trabalho.


Não se pode continuar com a lógica de que só os fortes podem sobreviver.




Aldeir Ferraz




sábado, 19 de setembro de 2020

A EGUA DO TATÃO

 Tatão é um camarada inteligente, apesar de vez ou outra tomar umas esbarradas.

Por falar em tomar, aprecia saborear umas cangibrinas e haja trupicão pra tanto canecão.

Com o preço da gasolina lá nas alturas resolveu nosso amigo encostar o carro e comprar um cavalo. Na verdade não é só por causa do tanque do seu automóvel, mas também pelo seu tanque que vivia entornando, entornando de cachaça.

O cavalo que comprou numa negociada no buteco da roça animou nosso desgustador de cana. Feliz com o preço que pagou chegou com o bicho em casa, mas logo notou assim que sarou que o cavalo faltava alguma coisa. 

Na verdade o cavalo era uma égua. Faz parte dos negócios regado a copos e mais copos.

O tempo passou e da égua ele bem cuidou. O animal se tornou seu protetor e sabe o caminho de volta do cavalgador.

Dizem os companheiros de gole que a egua do Tatão  é da igreja e por isso não bebe com o patrão.

Enfim, ele já "injeitou"  cinco mil nela. Assim nos falou. Também o animal é de valor mesmo, pois nunca deixou num tombo o Tatão pelo caminho.


Aldeir Ferraz


quinta-feira, 17 de setembro de 2020

A SOMBRA DE UM CAVALEIRO



— Então você é sobrinho do Avelino Inácio?

— Sim! Meu tio e padrinho!

Até hoje ainda encontro com pessoas neste cantão da Zona da Mata Mineira, por estas serras que rodeiam visconde do Rio Branco, alguém que conhece este homem, alguém que sabe das suas histórias.

Ser sobrinho e afilhado dele sempre me fazia ouvir e ainda ouço:

_“Então cê é gente boa uai!”

Talvez por seus negócios, por sua lida de homem do campo, da compra e venda de gado. Mas não é apenas isso que faz alguém ganhar o respeito no meio do povo, existe o jeito de ser.

Dele trago sempre a imagem do cavaleiro, montado em seu cavalo sob Sol escaldante, fazendo sombra na estrada, chegando de longe, empoeirado, mas bem alinhado desde a bota ao chapéu.

Gostava muito de passar as férias por lá. Na casa dele tinha uma televisão a bateria, engenho de rapadura, chiqueiro de porco, córrego pra pescar. Só tinha um problema que era a cachorrada brava…

Ah! Tinha muito serviço também, ali a turma ralava, sobrava até pra mim, ajudava a debulhar milho e até candear boi. Nesta segunda tarefa já cheguei quase tombar uma carroça com boi e tudo numa pirambeira, menino de rua dando uma de candeeiro é engraçado.

Sua história se mistura com sua mãe Jovelina, que viúva contou com sua lida para cuidar da subsistência das coisas que tinham.

Não posso esquecer do prazer que tinha de tomar uma cachaça e isso aí ninguém é de ferro, mas não bambeava com as goladas de jeito  maneira.

O povo da Folia de Reis fazia questão de madrugar na sua casa, pois a família era grande e todos acordavam pra receber a cantoria e a reza.

Enfim, com seu cavalo já não anda mais por estas bandas, mas com certeza cavalga entre as estrelas junto aos que deixaram aqui na Terra seus bons exemplos de coragem e dedicação aos seus.


Aldeir Ferraz



Vá na Fé Mestre Dão

O caminho agora é outro! Nossa! Quanto chão ficou pra trás. Lá na roça a quantidade de dias de Sol que tomou no lombo. Os calos na mão, cres...